Você sabe a origem do cabelo crespo? Sabe qual a diferença entre cabelos crespos e cacheados? Ou o porquê que o cabelo afro é aparentemente mais resistente ao alisamento, porém mais frágil e propenso a quebra?
Entender como é o fio por dentro é fundamental para oferecer o melhor cuidado, manter os fios nutridos, fortes e definidos. Confira!
Historicamente, os cabelos são carregados de simbolismos. E os cabelos crespos e cacheados já passaram por diferentes fases ao longo do tempo.
Com a entrada do século 20 veio a moda dos cabelos curtinhos e com ondas bem marcadas. Os acessórios de cabelo também faziam sucesso. Penas e faixas marcavam o visual das mulheres, principalmente em ocasiões especiais.
Na década de 1930 a padronização de cabelos lisos como belo cresceu significativamente e com isso as primeiras técnicas de alisamento ganhou força. Nos anos 1940 e 1950 os cabelos crespos eram usados em coques volumosos e cheios de formas. No início dos anos 1960 os cabelos crespos eram alisados e usados em coques.
No final dos anos 1960 e nos anos 1970, com os movimentos “black is beautiful” e “black power”, o cabelo crespo passou a significar orgulho e poder.
James Brown perfeitamente expressou esse momento no seu hit de 1968: “say it loud – i’m black and i’m proud” (“Diga alto: eu sou negra (o) e me orgulho disso! ”). Naquele momento, as pessoas que não usassem seu cabelo como um afro – ou porque a textura não permitia, ou simplesmente porque preferiam alisar – eram consideradas “uma contradição, uma mentira, uma piada”.
Os movimentos ajudaram não só a pensar estratégias políticas de combate ao racismo como também formularam um conjunto de ideias que inspiraram o ativismo de jovens militantes negros em outros países, além da presente e fortemente valorização da estética negra, valorização da herança africana e da cultura negra nessa militância.
Na década de 1980 a técnica que encaracolava os fios lisos – permanente – virou febre entre as mulheres que queriam aumentar o volume dos cabelos. Bobes e bigudinhos eram os acessórios mais usados para dar cachos aos mais variados tipos de mulher nos salões de beleza.
Na década de 1990, apesar de já existir há muito tempo, o movimento rastafári ganhou força. Todo mundo começou a usar os cabelos trançados.
Entretanto, na virada do século 21 os fios lisos voltaram a fazer a cabeça da mulherada quando a escova progressiva conquistou uma legião de usuárias, revolucionando o mercado de transformação capilar no Brasil.
Com o passar dos anos 2000, os cachos e a busca por uma beleza natural começam a voltar. Símbolo do amor próprio e do fortalecimento da identidade negra e afrodescendente, a nova geração de mulheres e homens começaram a reconhecer seu cabelo como cacheado e crespo, aceitando cada vez mais como são e acentuando sua beleza natural.
A ascensão dos cabelos naturais, dos fios encaracolados e crespos é uma forma de demostrar o desejo de afirmação, de liberdade de escolha, quebra de paradigmas e uma forma de questionar a sociedade em relação ao que é belo.
E atualmente vimos que a liberdade de escolha e o livre estilo ganharam força. No que diz respeito aos cabelos, há espaço para uma profusão de estilos, em fios lisos, multicoloridos, trançados, crespos, cacheados, volumosos e cheios de estilo. A regra é não ter regra!
Mas qual seria a origem do cabelo crespo? Você sabe?
ORIGEM DO CABELO CRESPO
A origem do cabelo crespo é histórica!
O tipo de fio se deve à maneira como cada um se adaptou e evoluiu em seu ambiente. Sendo a África o início de tudo, as primeiras pessoas tinham a pele negra, por exemplo, para se adaptar ao sol quente e às temperaturas muito altas entre os trópicos, considerando a localização do continente.
E a mesma questão climática se deve aos fios enrolados.
Os africanos desenvolveram cabelos crespos durante todo o processo de evolução para se adaptar ao clima quente, e hoje, muito tempo depois, seus descendentes ainda carregam essa característica.
Em geral, o cabelo crespo consegue manter uma camada de ar com poucos centímetros entre a cabeça e o ambiente, e esse espaço serve de refrigeração. E seu formato serve como proteção para o couro cabeludo, como um chapéu natural devido ao entrelaçamento dos fios, que se tornou uma herança.
E um estudo realizado por pesquisadores do Instituto de Pesquisa Médica de Queensland, na Austrália, em 2010, descobriu o gene que originou forma do fio enrolado: o nome dele é trichohyalina.
Uma variação nesse gene determina se o cabelo será liso ou cacheado.
Os cientistas também concluíram que ele é hereditário. Se a mãe tiver a genética do cabelo cacheado, a chance de passar essa característica para o filho é de 90%.
E qual seria a diferença entre cabelo crespo e cacheado?
CABELOS E SUAS FORMAS
A diferença está, basicamente, no espaçamento entre cada curva e o diâmetro da onda, ondulações ou cachos.
E com base nesse caráter ondulado e encaracolado dos cabelos, juntamente com as propriedades de cada tipo de cabelo, os cabelos foram classificados em 4 tipos: 1 – lisos, 2 – ondulados, 3 – cacheados e 4 – crespos. E dentro de cada grupo, existem as subdivisões A, B e C.
Nos cabelos lisos a haste capilar tem formato do bulbo capilar simétrico e redondo, com sentido de crescimento bem definido e angulação folicular vertical, o que permite que os fios permaneçam lisos e retos.
Nos cabelos ondulados e cacheados a haste capilar possui formato entre circular e elíptico achatado, sentido de crescimento bem definido, ondulação no prolongamento da haste capilar e projeção folicular levemente inclinada.
Já os cabelos crespos possuem o formato da haste capilar elíptico e achatada. Por causa desse formato e diferença de espessura, esse fio é sempre classificado como médio/fino. Possui também uma projeção folicular quase paralelo as primeiras camadas da pele.
E é essa assimetria da haste capilar dos cabelos crespos e cacheados que é responsável pela aparência enrolada dos fios.
Veja abaixo as principais diferenças entre os tipos de cabelos:
1 – LISOS
Essa forma de cabelo é mais comum entre asiáticos, europeus, índios, entre outros. É totalmente liso, sem nenhuma ondulação, da raiz às pontas. Tentem a ser mais oleosos e exigem cuidados especiais, pois apresentam menor flexibilidade e maior facilidade a danos.
2 – ONDULADO
O cabelo ondulado geralmente nasce liso na raiz e forma ondulações ao longo dos fios. Forma mechas em padrão de S e é mais suscetível ao frizz.
3 – CACHEADO
Os cabelos cacheados formam cachos bem definidos ao longo dos fios. Essa forma de cabelo dificilmente é oleosa, pois esse formato impede que a oleosidade produzida na raiz chegue até as pontas. Consequentemente, os cabelos ficam mais secos, frágeis e arrepiados, exigindo maiores cuidados.
4 – CRESPOS
São os cabelos geralmente conhecidos como afro. Os cabelos crespos nascem bem enrolados desde a raiz, sendo mais ressecados e opacos que os demais tipos de cabelo, devido à impossibilidade da oleosidade se distribuir pelos fios. Por isso necessitam de bastante hidratação para que revelem toda a sua beleza e não se quebrem à medida que vão crescendo. Sua principal característica é o volume e tende a arrepiar com maior facilidade em ambientes mais úmidos.
Uma curiosidade interessante é que esse sistema de classificação foi desenvolvido pelo cabeleireiro norte-americano Andre Walker – responsável pelo visual da apresentadora Oprah Winfrey por mais de duas décadas -, em 1997, enquanto escrevia o livro Andre Talks Hair. Essa proposta de classificação ganhou relevância entre as marcas e os cabeleireiros mundo afora.
A tabela também passou a ajudar consumidores na busca por produtos mais adequados às texturas e à curvatura de seus cabelos.
Mas por que o cabelo crespo que aparentemente é mais resistente ao alisamento, é tão frágil e propenso a quebra?
POR QUE O CABELO CRESPO E CAHEADO É RESISTENTE AO ALISAMENTO, MAS TÃO FRÁGIL E PROPENSO A QUEBRA?
Um mito antigo popular e preconceituoso diz que negros possuem cabelo grosso e duro, esse mito é totalmente desmentido diante de uma constatação científica: na verdade, o cabelo crespo é muito mais sensível e macio.
Em geral, os cabelos são constituídos de proteínas formadas por longas cadeias de aminoácidos, ligados entre si por diferentes tipos de interações.
A queratina é a principal proteína presente nos fios. Por ser rica em enxofre, ela permite realizar uma grande quantidade de interações, denominadas pontes de dissulfeto, que são responsáveis pela manutenção do formato e textura dos fios.
A fibra capilar é composta por cutícula, córtex e medula.
A cutícula corresponde à estrutura externa da fibra e possui em média entre 6 a 10 camadas de células sobrepostas (como as telhas em um telhado) que atuam como uma camada protetora.
Enquanto os fios lisos possuem até 14 camadas de células sobrepostas na cutícula de forma simétrica, os cabelos crespos possuem apenas de 2 a 5 camadas distribuídas de forma assimétrica ao longo dos fios. Esta característica torna os fios mais frágeis as agressões externas, porque sua camada protetora é menor e irregular em comparação com os outros tipos de fios.
O córtex é rodeado pela cutícula, contém a maior quantidade de massa da fibra capilar e tem alto grau de organização estrutural. Ele é formado por células alongadas que contêm o pigmento natural do cabelo, a melanina, e por restos de núcleo celular.
Os cabelos crespos e cacheados possuem tal formato devido a distribuição da queratina dentro do córtex, que como vimos é a estrutura interna do fio. Para criar a curvatura, a queratina fica distribuída de forma elíptica, o que leva a uma quantidade maior de queratina nos lados e menos no centro da circunferência da haste.
Dessa forma, quanto mais distribuída for a queratina dentro do córtex capilar, ou seja, com uma circunferência completa de queratina em volta dele, mais liso o fio.
Já uma distribuição irregular, com mais queratina em alguns dos lados e menos em outros, é que leva aos cachos.
E se a distribuição da queratina é totalmente polarizada, ou seja, apenas de um lado ou polo, os fios nascem do tipo crespo.
Consequentemente, devido ao seu formato, o cabelo cacheado e crespo tem menos massa proteica de córtex que os outros tipos de fios, e com isso tem menor quantidade de queratina. Isso resulta em menor resistência, um fio mais fino e que se quebra com facilidade.
Essa quantidade reduzida de massa de córtex faz com que os fios enrolados apresentem dificuldade em absorver moléculas de produtos cosméticos, e com isso, a coloração desbota com mais facilidade e os tratamentos tem duração reduzida.
O formato também determina a intensidade de brilho e a capacidade do sebo cobrir a haste capilar.
O cabelo liso tem brilho mais intenso que o crespo devido a reflexão máxima de luz na superfície lisa, já as fibras irregulares tornam o cabelo opaco.
Também possuem menor lubrificação e hidratação natural ao longo da haste, pois o óleo produzido pelas glândulas sebáceas não conseguem chegar até o final da haste devido as várias curvaturas existentes, ficando a lubrificação mais próxima ao couro cabeludo, por isso são mais ressecados do que os demais tipos de cabelos.
E por último temos a medula que está localizada no centro da fibra capilar, no qual nem sempre está presente. Ela é camada mais profunda do fio, formada por células de estrutura esponjosa, com cavidades ocas. A função da medula ainda não foi completamente definida, mas sabe-se que ela é responsável pela flexibilidade do fio.
Nos cabelos crespos e cacheados a medula é ausente, por isso esses tipos de fios não apresentam flexibilidade e possui a forma recolhida.
De forma geral, devido as características que vimos, os cabelos crespos e cacheados apresentam menor conteúdo de água, menor resistência ao estiramento, são mais fracos e menos resistentes, com alto potencial de formar frizz e de difícil manuseio. Consequentemente, têm maior tendência ao ressecamento e a quebra, e o simples ato de penteá-los ou secá-los pode ocasionar danos em pontos específicos da fibra.
Porém, normalmente, esse tipo de fio recebe muito bem produtos de alisamento.
Por que?
Como vimos a principal proteína presente no cabelo é a queratina, que é rica em enxofre que permite uma grande quantidade de interações químicas, chamadas de pontes de dissulfeto.
Para alisar os fios, é preciso abrir a cutícula, desestruturar as pontes de enxofre que mantém o formato do fio e reestruturar a haste numa outra forma.
Como o cabelo crespo possui uma menor quantidade de queratina, consequentemente tem uma menor quantidade de enxofre e de interações químicas a serem quebradas, o que facilita o alisamento dos fios e acaba nos dando essa impressão de que o cabelo crespo resiste bem ao alisamento.
Mas ele também necessita de tratamentos e manutenções especificas no pós-química.
Todas essas características que vimos, entre outras, fazem com que os cabelos crespos e cacheados demandem cuidados especiais na hora de cuidar dos fios.
COMO CUIDAR DO CABELO CRESPO E CACHEADO?
Como vimos o cabelo crespo e cacheado têm maior tendência ao ressecamento e à quebra, portanto incluir hidratações no dia a dia é fundamental.
Por isso, um cronograma capilar é essencial para proporcionar um resultado incrível para as mulheres de cabelos cacheados e crespos. Ajuda a repor água, nutrientes, lipídeos e fortalecer a fibra capilar. Por isso ele é tão importante para manutenção do cabelo saudável e reestruturação do cabelo danificado. Portanto, organizar os dias da hidratação, nutrição e reconstrução e são primordiais para manter os cachos definidos e saudáveis.
Por serem naturalmente ressecados os cabelos cacheados e crespos possuem mais frizz. Para controlar a situação, o indicado é o uso de produtos como cremes de pentear e óleos, pois ajudam a deixar os cabelos crespos e cacheados mais hidratados e longe dos fios arrepiados.
Outra alternativa é utilizar produtos que contenham silicone em suas formulas. Os silicones ajudam a selar e suavizar o cabelo deixando-o mais suave, mais fácil de controlar, e menos propenso ao frizz; portanto, os cachos são mais definidos.
Se quiser controlar o volume dos cabelos não aplique muito creme. A ideia de que lambuzar os cabelos com muito creme vão deixá-los menos volumosos e mais definidos é um mito. O primeiro passo para cachos perfeitos são fios nutridos e hidratados e depois o ideal é passar uma quantidade moderada de produto para ajudar na definição dos cachos e volume, porque o excesso do produto pode deixar as madeixas pesadas.
Outro ponto de atenção importante é não desembaraçar os cabelos quando estiver seco. Como esse tipo de fio é muito frágil, essa prática apenas fará com que suas madeixas fiquem quebradas e ressecadas. Por isso, penteie seus cabelos sempre quando eles estiverem molhados, preferencialmente durante o banho.
Quanto a lavagem dos cabelos: cabelos cacheados é indicado lavar três vezes por semana, enquanto os cabelos crespos podem ser lavados até duas vezes. Não prenda os fios com o cabelo molhado! Como os cabelos estão mais sensíveis pela absorção da água da lavagem, prendê-los pode causar danos.
Como vimos, além de terem menor lubrificação ao longo do fio, os cabelos cacheados não são simétricos entre as camadas de cutículas, assim, o simples ato de pentear ou secar os fios pode ocasionar danos em pontos específicos da fibra. Portanto, dê preferência para pentes de dentes largos ou para os dedos, já que escovas de cabelo e pentes finos também servirão apenas para quebrar o fio, danificando sua estrutura.
Se você está passando por uma transição capilar saiba que produtos como ativador de cachos e/ou umidificador não vão resolver seu problema instantaneamente, mas podem ajudar. Uma boa saída é apostar em técnicas de texturização. Portanto, não quiser o Big Chop é preciso ter um pouco de paciência para aguardar os cabelos crescerem.
Veja também “ CABELOS COLORIDOS: UM UNIVERSO DE POSSIBILIDADES”.
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Fonte:
Hallal Halal, John. Tricologia e a Química Cosmética Capilar: Tradução da Quinta Edição Norte-Americana. São Paulo – CENGAGE LEARNING, 2011.
https://repositorio.ufjf.br/jspui/bitstream/ufjf/5936/1/jordanadiasdossantos.pdf
https://www.dw.com/pt-002/hist%C3%B3ria-de-%C3%A1frica/s-39635356
Cosmetics and Toiletries. Texture Talk. February_2022.
Cosmetics and Toiletries. Edição Temática. Outubro_2007.
Cosmetics and Toiletries. Edição Temática. Agosto_2009.
Cosmetics and Toiletries. Edição Temática. Outubro_2017.
Cosmetics and Toiletries. Edição Temática. Setembro_2022.
USA (Marshay) | 100 Years of Beauty – Ep 2 | Cut https://www.youtube.com/watch?v=LTp9c9bsY_Q