A viscosidade de um shampoo sofreu alteração, ou seja, ele ficou mais fluido? Além disso, sua cor e cheiro mudaram? Sabe por que ocorreram essas alterações? Contaminação!! A contaminação altera as características desse produto e uma das vias mais importantes de contaminação de produtos de higiene, perfumaria e cosméticos é a água. Portanto, para evitar esse problema e garantir a qualidade de seus produtos cosméticos, veja os processos básicos e complementares de tratamento da água. Confira!
Aproximadamente dois terços da superfície da Terra estão cobertos por água. Em razão da abundância da água em nosso planeta, muitos de nós a consideram um elemento barato e inesgotável. Contudo, nos últimos anos, essa concepção vem se modificando.
Do total de água disponível no planeta, apenas pequena parte é adequada para o consumo humano: 0,7% de água doce, que está nos rios, lagos e lençóis freáticos. O restante da água não é próprio para consumirmos, pois 97% é salgada e fica nos oceanos, e 2,3% está congelada nos polos do planeta. Do total de água doce, 70% são utilizados na agricultura; 22% na indústria; e apenas 8% nas cidades, para consumo humano.
De acordo com o relatório da Organização Mundial das Nações Unidas (ONU), o abastecimento mundial de água doce está seriamente ameaçado por causa do aumento da população, de irrigação irresponsável, de mudanças climáticas e de desperdícios crônicos desse recurso. No entanto, não é mais novidade para ninguém, que a água faz parte de uma complexa rede de fatores que determinam a prosperidade e a estabilidade de um povo, e que a falta desse recurso aumenta a pobreza e as privações, sendo uma causa potencial de distúrbios e conflitos.
A água é o principal insumo da indústria de cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumaria. Tem participação importante nas emulsões, como solubilizante de certos princípios ativos, e em deocolônias e outros produtos perfumados. Também é o insumo importante na limpeza de equipamentos e instalações.
Diante disso tudo e como profissionais conscientes que somos, devemos sempre tentar ao máximo evitar o desperdício, sua contaminação e ter os cuidados especiais para obtê-la, trata-la e armazená-la para produção de produtos cosméticos. Lembremo-nos sempre de preservar esse bem tão precioso!
No Brasil, a maioria das categorias de água utilizadas pela indústria cosmética seguem padrões definidos pela Farmacopeia dos Estados Unidos (USP) e, em alguns casos, pela Farmacopeia Europeia (EP). Nos processos de produção de cosméticos, basicamente, é usada água de baixa concentração de sólidos, sais e minerais dissolvidos, e livres de contaminantes biológicos.
Todavia, em algumas aplicações, por causa de necessidades específicas ou conveniência, podem ser utilizadas águas com características que não se enquadrem necessariamente nos padrões das farmacopeias, casos em que as indústrias cosméticas atenderão aos requisitos mínimos de água potável. De acordo com a RDC nº 48/13 (que substitui a portaria SVS nº 348/97), o fabricante é responsável pela caracterização da água, e esta deve atender, no mínimo, os requisitos básicos de potabilidade.
Essas águas, dependendo das características físico-químicas, também passarão por tratamento adicional, para que atendam a demanda especificas do processo. Isso ocorre, por exemplo, na fabricação de shampoos. Quem fabrica esse tipo de produto não precisa, necessariamente, usar água desmineralizada, pois os shampoos apresentam alta concentração de sais. Mas, ao mesmo tempo, essa água deve atender aos requisitos microbiológicos.
Veja abaixo os tipos de materiais presentes na água.
MATERIAIS PRESENTES NA ÁGUA
A água é o solvente universal da maioria das substâncias. Principalmente devido as suas características, é utilizada por todos os setores da economia em diversos processos industriais. Para tanto, esse recuso é retirado de rios, poços e outros mananciais. A água também pode ser captada do mar, caso em que é dessalinizada, o que demanda um processo dispendioso. Mas não basta retirar a água desses locais e em seguida utilizá-la; é preciso tratá-la para retirar suas impurezas.
Quando está em seu estado natural, a água contém impurezas que variam dependendo do histórico prévio e do contato que essa substância teve com a atmosfera e o solo. Essas impurezas podem ser matérias em suspensão (partículas não dissolvidas que ficam suspensas no corpo da água) ou matérias em solução (dissolvidas na água). Em geral, são compostos orgânicos dissolvidos, sólidos dissolvidos ionizados, gases dissolvidos, matéria em suspensão, incluindo microrganismos e matéria coloidal.
A avaliação da qualidade da água, para consumo humano ou uso industrial, não exige o conhecimento de todos os materiais nela presentes. É suficiente identificar suas características gerais, para, com base nestas, definir os sistemas de tratamento para adequação da água ao uso final. Essas características são:
PROCESSOS BÁSICOS DE TRATAMENTO
O processo clássico para eliminar matérias em suspensão, cor e odor da água consiste em coagular, decantar e filtrar, e a ele podem ser adicionados os processos de cloração e desmineralização.
As quantidades de matéria em suspensão são analisadas por meio da cor e da turbidez. A cor nas águas é produzida pela reflexão da luz em partículas minúsculas chamadas coloides, finamente disperdas, principalmente de origem orgânica e dimensão inferior a 1 mm. Em geral, essas partículas provêm da decomposição de matéria orgânica (em sua maior parte de origem vegetal) e do metabolismo de microrganismos que vivem no solo. Também pode resultar de descargas de efluentes domésticos ou industriais, lixiviação de vias urbanas e solos agricultáveis. Compostos de ferro e manganês ou de diversos tipos de resíduos industriais presentes na água também podem lhe conferir cor. Em águas de lençóis freáticos, quando há cor, este, via de regra, ocorre por causa da presença de compostos. Eles podem apresentar-se na forma de partículas ou estar dissolvidos na água.
A turbidez, causada por matérias sólidas em suspensão, é a medida de dificuldade que um feixe de luz encontra para atravessar certa quantidade de água. Quando há turbidez, a luz é dispersa ou absorvida, em vez de ser transmitida em linha reta através da água.
Coagulação
Consiste na desestabilização das partículas em suspensão e coloidais realizadas pela conjunção de ações físicas e reações químicas, com duração de poucos segundos, entre o coagulante – um produto químico -, a água e as impurezas presentes na água, para que haja floculação (aglomeração das partículas suspensas). Entre os coagulantes mais conhecidos, estão: sulfato de alumínio, sulfato férrico, sulfato ferrosos, cloreto férrico e polieletrólitos.
Quando coagulantes são colocados na água, o sulfato de alumínio, o sulfato ferroso ou o sulfato férrico reagem com a alcalinidade natural da água ou adicionada a esta, formando polímeros, como hidróxido de alumínio e hidróxido de ferro, dependendo das reações. Posteriormente, esses hidróxidos, que têm carga superficial positiva, neutralizam as cargas negativas dos coloides em suspensão na água, encapsulando-os dentro de sua estrutura floculenta. Os flocos relativamente densos se precipitam e a água fica praticamente livre de turbidez.
Decantação
Após passar pelo tanque de coagulação, a água floculada é levada para o decantador, que remove as partículas em suspensão mais densas do que a água. Esse percurso deve ser o menor possível e realizado em condições que evitem quebra de flocos e impeçam a sedimentação de partículas.
O tempo de decantação é aquele necessário para encher o decantador em uma dada vazão. A ação da gravidade faz que as partículas em suspensão se depositem no fundo do decantador. Quanto maior for o tempo de decantação, melhor será a qualidade da água na saída do decantador, pois os flocos terão mais tempo para se sedimentar, e o desempenho dos filtros será facilitado porque estes poderão ser mantidos por mais tempo em operação sem a necessidade de que sejam lavados.
Filtração
Consiste na retenção de impurezas ou substâncias suspensas na água, realizada por meio de filtros de areia, carvão ativado e cascalho. As estações de tratamento de água possuem filtros rápidos que funcionam por ação da gravidade e sob pressão, com diversas camadas filtrantes. São lavados em contracorrente (inversão de fluxo) com vazão de assegurar uma expansão adequada para o meio filtrante.
Cloração
O processo de cloração consiste na adição de cloro na água, com o objetivo de esteriliza-la e torna-la potável. Além de amplo espectro de ação germicida, o cloro forma compostos que ficam na água, oferecendo um residual desinfetante ativo que permite a inativação de microrganismos a partir do ponto de sua aplicação, nas tubulações da rede de distribuição e nos reservatórios domiciliares dos pontos de consumo.
Por causa do alto poder oxidante, o cloro também é aplicado para o controle de cor e sabor, a remoção de ferro e manganês, a prevenção de crescimento de algas e o controle do desenvolvimento de biofilmes em tubulações.
PROCESSOS COMPLEMENTARES DE TRATAMENTO
Para determinados usos, principalmente em operações industriais, a água é submetida a processos específicos.
Desmineralização ou Deionização
É o processo de remoção praticamente total dos íons presentes na água e de redução de sua condutividade, realizado por meio de resinas de troca iônica: catiônicas e aniônicas. A água pode conter íons por causa de sais minerais dissolvidos, como os cátions cálcio, magnésio, sódio, potássio, hidrogênio, ferro e manganês, e os ânions, por exemplo, bicarbonato, carbonato, hidróxido, cloretos, sulfato e nitrato.
A desmineralização ocorre quando a água atravessa colunas de resina catiônica, carregada com íons H+, e aniônicas, carregada com íons OH–, ou ao passar por uma única coluna que apresente esses dois tipos de resina, chamada leito misto.
As resinas catiônicas são regeneradas pela introdução, em seu gripo funcional, de cátions H+ , por meio de soluções diluídas de ácido sulfúrico ou clorídrico. Simultaneamente a introdução de cátions H+, devido ao seu excesso, são trocados íons catiônicos com bicarbonatos Ca++, Mg++, Na+ e K +.
Para a regeneração das resinas aniônicas são introduzidos, em seu grupo funcional, íons OH– que são trocados, durante o processo de desmineralização, por íons como CO3—, HCO3–, Cl–, NO3–, SO4–, SiO2 e CO2. A regeneração da resina é obtida passando-se por ela determinada quantidade de solução de NaOH.
Os copolímeros sintéticos reagem com grupos funcionais ativos que absorvem íons (cátions ou ânions) de uma solução e os substituem por quantidades equivalentes de outros íons de mesma carga, de acordo com uma escala de seletividade, ou seja, de preferência iônica. Por exemplo:
Osmose Reversa
É o processo que consiste em a água atravessar uma membrana, sob pressão, para que ocorra a redução da concentração de íons, moléculas orgânicas, microrganismos, endotoxinas e particulados.
Polimento
Após os tratamentos principais, dependendo da aplicação a que se destinar a água, esta poderá passar por tratamentos complementares de “polimento” para atingir os parâmetros da especificação requerida pelo uso. Como exemplo de polimento, temos a combinação de osmose com leito misto de resina de troca iônica.
Ultrafiltração
É realizada novamente na fase de “polimento”, após a troca iônica, para a redução de componentes orgânicos, sílica coloidal, carga microbiológica e endotoxinas.
Radiação Ultravioleta (UV)
É um agente físico usualmente empregado para reduzir cargas microbianas em águas principalmente de uso industrial. Para a desinfecção da água são utilizadas lâmpadas de UV de baixa pressão de vapor de mercúrio, que emitem entre 85% e 90% de radiação no comprimento de 254 nm.
Radiações eletromagnéticas no comprimento de onda de 240 a 280 nm têm efeito desinfetante. A radiação UV provoca danos ao DNA dos microrganismos, principalmente nas bases pirimídicas e nas ligações dissulfeto presentes nos complexos proteicos e enzimáticos, levando a morte celular.
Abrandamento
O abrandamento ou diminuição da dureza total das águas, é realizado por meio de troca iônica e de dealcalinização. A água pode ser abrandada, por exemplo, por uma técnica que utiliza resinas trocadoras de cátions, especificamente as que trocam sódio por cálcio e magnésio.
Esse processo consiste em passar a água a ser abrandada por um leito de resinas trocadoras de cátions, cujo grupo funcional esteja carregado de Na+. Assim, o Ca++ e o Mg++ (como Fe, Mn e Al), na forma de sais solúveis na água, também são trocados por Na++. Lembrando apenas que devido a sua afinidade, as resinas podem perder a capacidade de troca, quando a água for rica em ferro solúvel.
Por essa razão, é muito importante o pré-tratamento da água para eliminar íons como ferro e matérias orgânicas que podem “envenenar a resina”, ou seja, diminuir a capacidade de troca iônica, por perda da capacidade de troca de íons dos grupos funcionais.
A regeneração de resinas consiste em introduzir o átomo de sódio na resina, deslocando-se o cálcio e o magnésio. Isso é obtido com a utilização de uma solução a 10% de NaCl.
PRESERVAÇÃO DA QUALIDADE DA ÁGUA
Para que a qualidade da água de processo seja preservada, é fundamental controlá-la no aspecto físico-químico e, principalmente, microbiológico, por meio da utilização de monitoramento e da sanitização.
Monitores
O controle da qualidade da água de processo é realizado por meio de medições, que são feitas, por exemplo, por medidores de pH e condutivímetros. É necessário avaliar diariamente o pH, a condutividade e a concentração do agente antimicrobiano. Juntos, o pH e o valor da condutividade indicam o estado de saturação das resinas e se há necessidade de regeneração. Valores fora do especificado podem indicar fuga de íons, que compromete a qualidade do produto final.
A presença de íons inorgânicos em grande concentração, como magnésio e zinco, pode provocar a separação de fases em emulsões. Caso haja pequena concentração de cálcio, magnésio, ferro e alumínio, pode ocorrer precipitação lenta de resíduos em produtos hidroalcoólicos (loções e loções pós-barba). Isto causará turvação do produto quando ele já estiver no ponto de venda. A presença de metais, principalmente de ferro, traz risco de alteração da cor de certos produtos, principalmente daqueles que contenham compostos fenólicos, como extratos vegetais que possuam polifenóis.
Higienização
A higienização de equipamentos e, de linhas de água e de processo, realizada com agentes de limpeza e sanitizantes, deve ocorrer periodicamente para evitar formação de biofilme e acúmulo de matérias orgânicas combinadas com sais minerais.
Os sanitizantes devem ser selecionados com base na verificação experimental da eficácia da concentração e do tempo de contato. Aconselha-se que os procedimentos de limpeza, sanitização e manutenção sejam descritos e documentados com frequência definida e devidamente validados.
Devem ser definidos os pontos críticos do sistema de água: armazenamento, filtros, pós desmineralização, pós UV e pontos de uso. O monitoramento físico-químico e microbiológico deve ser contínuo. O sistema deve possibilitar a amostragem nos pontos de entrada e de saída das principais unidades e sistemas de tratamento, armazenamento e circulação, bem como nos pontos de uso. Também deve ser realizado o monitoramento microbiológico sistemático dos pontos críticos.
EFEITOS DOS BIOFILMES
Em estações de tratamentos, os biofilmes podem ajudar a remover organismos patogênicos, participam na reciclagem do enxofre proveniente de matéria orgânica nos efluentes. Trabalham como filtros naturais, quando a velocidade de permeação da água for baixa.
Contudo, em muitas situações, o crescimento de biofilmes não é desejável, pois sua presença pode trazer consequências negativas. A contaminação microbiana traz risco de deterioração da qualidade da água, que exerce papel fundamental nas diferentes fases do processo de fabricação de produtos, como os cosméticos. Também pode provocar redução de fluxo e corrosão das linhas do sistema de água.
Sistemas de purificação e distribuição de água são meios propícios para a colonização microbiana porque fornece as quatro condições necessárias a existência desta:
O processo de formação de biofilmes é inevitável. Por isso, para evitar a formação de novas colônias, é necessário controlar rigorosamente os sistemas de purificação de água e os processos de tratamento, realizando remoção química e mecânica, além de manutenção preventiva e uso de agentes microbianos.
O controle dos sistemas de purificação da água é realizado, por exemplo, por meio da utilização de clorados (hipoclorito de sódio, gás cloro, dióxido de cloro), oxidantes que formam cloro (cloro residual) que ficam na água após a aplicação, e se degradam após certo tempo, variando de acordo com o tipo de oxidante usado.
Estes são os processos básicos e complementares para tratamento da água utilizada na produção de produtos cosméticos, onde devemos ter um sistema preservante adequado para cada tipo de formulação e certos cuidados em relação as condições de processo – incluindo a água -, as instalações, aos equipamentos e até a higiene pessoal dos profissionais que atuam nas áreas produtivas.
A produção de produtos cosméticos requer especificações mínimas de qualidade para as águas, de acordo com cada tipo de aplicação, de processo de fabricação e com as características do produto. Por isso, essas especificações têm de ser consideradas na elaboração do projeto do sistema de tratamento de água, levando em conta os investimentos iniciais do projeto e a instalação do sistema e os custos de operação e manutenção durante a vida útil deste. Existem muitos sistemas disponíveis no mercado para atender a variadas demandas de vazão e as características finais das águas de processo.
Veja também “BOAS PRÁTICAS DE FABRICAÇÃO PARA COSMÉTICOS”.
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