Apesar de atualmente vivemos na onda dos cachos, da crescente adesão à transição capilar e de ressaltar a beleza natural dos cabelos, ainda há quem prefira tratamentos que deixam as madeixas alisadas ou que controle o volume dos fios. E não há nada de errado nisso! Afinal, o que importa é nos sentirmos bonitas e satisfeitas com a nossa aparência. Portanto, entenda mais sobre as escovas progressivas e os aspectos regulatórios. Confira!
Não importa nosso humor, se estamos tristes ou felizes, sempre estamos insatisfeitas com os nossos cabelos e queremos modificá-los. E com uma das maiores variedades de tipos de cabelo no mundo, os produtos para a transformação dos fios sempre tiveram forte relevância no Brasil.
A escova progressiva foi uma das invenções que revolucionou o mercado de transformação capilar, e apesar da técnica não ter sido inventada no nosso país, ela teve aqui seu desenvolvimento máximo.
E mesmo após ter sua imagem associada aos malefícios acarretados pelas elevadas concentrações de formol empregados no início dos anos 2000 e da forte valorização dos cabelos naturais, a escova progressiva ainda mantém seu espaço no mercado, com um público fiel. Portanto, veja abaixo o que é a escova progressiva e entenda seu mecanismo de ação.
ESCOVA PROGRESSIVA: O QUE É E SEU MECANISMO DE AÇÃO
Resumidamente, os cabelos são constituídos por proteínas formadas por longas cadeias de aminoácidos, ligadas entre si por diferentes tipos de interações. A queratina é a principal proteína presente no fio. Ela é rica em enxofre, o que permite uma grande quantidade de interações, denominadas pontes de dissulfeto, que são responsáveis pela manutenção do formato dos fios.
Esse formato é determinado geneticamente e cada tipo de cabelo distribui a queratina dentro do córtex do fio de forma diferente. Para alterar essa forma é preciso modificar a distribuição de queratina quebrando as pontes de dissulfeto, porém elas não são fáceis de serem quebradas.
Portanto, para que isso aconteça é necessário abrir a cutícula do fio, aplicando um produto químico que vai desestruturar esse arranjo e depois refazer o fio na forma desejada. Assim, para modificar o formato dos fios é preciso abrir a cutícula, desestruturar as pontes de enxofre que mantém o formato do fio e reestruturar a haste numa outra forma.
Antigamente, o único sistema de alisamento permanente dos fios disponível no mercado era o alcalino ou básico, denominado relaxante químico. Normalmente formulados com hidróxido de sódio, tioglicolato e guanidina, os alisantes alcalinos possuem pH elevado, entre 9,0 a 14,0, que causam o intumescimento da fibra capilar, permitindo que o agente alcalino penetre nos fios, até a endocutícula. Ao entrar em contato com o córtex, o produto reage com a queratina, quebrando e reorganizando as pontes de dissulfeto, que fazem a molécula de queratina espiral tornar-se macia, alcançando o alisamento.
Neste tipo de alisante não é necessário a utilização de calor, por causa do fenômeno chamado “supercontration”, que fornece tensão suficiente para alisar a fibra em uma base permanente.
Já as escovas progressivas estão no grupo dos ácidos, e de forma geral, trazem a combinação de ácido glioxílico e carbocisteína. O seu procedimento, que é especifico para mudar a forma e diminuir o volume dos fios, transforma o formato da haste capilar combinando o uso de uma emulsão condicionante contendo ácido glioxílico, aliado ao processo térmico, utilizando secador e chapinha.
O mecanismo de ação dos ácidos acontece pelo meio reacional ácido, que provoca alterações químicas significativas na estrutura dos aminoácidos, através da reação entre o radical aldeídico com os grupamentos amínicos e as pontes dissulfeto. O radical ácido que também reage com o grupo amínico e as pontes dissulfeto, origina uma estrutura biopolimerizada de característica hidrofóbica, após o enxague, associado ao calor de 180°C a 230°C, conferindo o efeito liso aos cabelos.
Porém, na grande maioria das vezes, esse procedimento não dura muito, geralmente, de dois a três meses, dependendo da porosidade do cabelo antes de o tratamento ser feito, tendo que ser repetido com frequência, o que danifica a haste capilar, podendo levar a quebra dos fios ou sua fragilização, com perda de volume da queratina e a uma maior condição de quebra.
O processo de alisamento dura cerca de 2 horas, onde a maioria dos profissionais segue os seguintes passos:
ESCOVA PROGRESSIVA E SUAS POLÊMICAS
A escova progressiva conquistou grande popularidade nos anos 2000, em razão do resultado satisfatório após a primeira aplicação, atribuindo aos fios um aspecto suave, maleável, natural e brilhante. Nesta época, aplicavam-se altas concentrações de formol, alcançando até 20% em solução a 37%.
Em síntese, o mecanismo de ação do formol constitui em utilizar as pontes dissulfidicas já rompidas para formar uma ligação metilênica. O calor do secador e da chapinha promove uma ação de termofusão entre o formaldeído e a queratina, formando uma estrutura “plastificada”, deixando os cabelos mais lisos e não ásperos.
Contudo, ao mesmo tempo em que se tornava uma febre nos salões de beleza, o procedimento foi alvo de controvérsia, em virtude das inúmeras reclamações por parte das usuárias. As queixas referiam-se a irritações na boca, nos olhos e no nariz, a queimaduras no couro cabeludo, dificuldade para respirar e dores de cabeça e garganta.
Além de colocar em risco a saúde do cabeleireiro e do cliente, o uso contínuo e a alta concentração da substância faz com que o cabelo vá se plastificando, tornando-o ressecado e facilitando o mecanismo de ruptura do fio, devido à redução da elasticidade da fibra.
Depois que a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) proibiu o uso de qualquer produto que contivesse formaldeído em concentrações superiores a 0,2% em produtos cosméticos nas funções de conservante e de agente endurecedor de unhas (limite máximo de 5%), a indústria buscou alternativas para a substituição do formol, como os produtos à base de carbocisteína e ácido glioxílico, chegando, então, ao mercado escovas progressivas de verniz, inteligente, de mel, marroquina, de chocolate, entre tantas outras.
Tais escovas possuem o mesmo mecanismo de ação, entretanto proporcionam diferentes intensidades de alisamento, que varia de acordo com a composição e do tipo de cabelo.
Porém, o uso do ácido glioxílico nas escovas progressivas, cuja utilização como alisante só é permitida no Brasil em associação com a carbocisteína, gera certa polêmica no que diz respeito à liberação de traços de formaldeído, em virtude da sua decomposição quando é submetida a altas temperaturas.
A concentração liberada está abaixo dos limites de tolerância estabelecidos pelos principais órgãos fiscalizadores, como a American Conference of Governmental Industrial Hygienists (ACGIH), por exemplo. Entretanto, estudos mostram que a concentração de ácido glioxílico contido nos produtos cosméticos é consumida durante o processo reacional de alisamento, e que o resíduo gerado após o enxágue (traços de formaldeído) não acarretam impactos toxicológicos significativos.
Outro ponto que gera polêmica está relacionado ao certificado de qualidade do ácido glioxílico. Segundo a RDC n° 3, de 18 de Janeiro de 2012, o máximo permitido da impureza denominada glioxal é de 100 ppm ou 100 mg/k, porém, até então, nenhum fornecedor no Brasil conseguiu apresentar à Anvisa um certificado de atendimento a este requisito.
No Brasil, o uso do ingrediente é proibido pela Anvisa em produtos com ação alisante e/ou submetidos a tratamento térmico desde 2014. Contudo há perspectiva de regularização da substância para uso em escovas progressivas no país, devido à grande evolução tecnológica desta nova classe de alisantes ácidos funcionais.
Entretanto, ainda é necessário que algum fabricante de ácido glioxílico consiga fornecer o produto com baixa impureza em relação ao glioxal para que possa ser comprovado sua inocuidade e esclarecido as dúvidas quanto a toxicidade dos vapores gerados durante o processo de aplicação da escova progressiva.
REGULAMENTAÇÃO
Não existe uma regulamentação específica para o termo “escova progressiva”, visto que os métodos para a realização da escova progressiva não são registrados na Anvisa, apenas são registrados os produtos para alisamento capilar.
Quantos aos aspectos legais para as escovas progressivas, temos:
1 – RDC 3, publicada em Janeiro de 2012: Dispõe sobre os ativos alisantes capilares aprovados: ácido tioglicólico e seus sais, ésteres do ácido tioglicólico, hidróxido de sódio ou potássio, hidróxido de lítio, hidróxido de cálcio, sulfitos e bissulfitos inorgânicos.
2 – RDC 409, publicada em julho de 2020: Dispõe sobre procedimentos e requisitos para a regularização de produtos cosméticos para alisar ou ondular os cabelos, a definição dos produtos que modificam a estrutura química capilar para alisar, reduzir o volume ou ondular os cabelos com duração do efeito após enxágue, bem como o método empregado nos testes apresentados para fins de aprovação de novos ativos alisantes ou ondulantes ou para fins de registro do produto final, que deve satisfazer métodos validados. Determina ainda os limites máximo e mínimo de concentração de ingrediente(s) ativo(s) no produto acabado em relação à concentração do(s) ingrediente(s) ativo(s) declarada na fórmula do produto.
3- Instrução Normativa 64: Define a lista de ativos permitidos em produtos cosméticos para alisar ou ondular os cabelos.
Por fim, o mercado de escovas progressivas é polêmico e não é fácil de trabalhar, pois ainda existem muitas inconformidades de produtos, notificação na categoria errada ou produtos sem registro na Anvisa, que podem levar o profissional ao erro.
Em contramão, a atualidade nos mostra a importância da preservação/conservação de tudo ao nosso redor, inclusive dos produtos cosméticos de nosso uso diário. Por isso, existe uma forte tendência de produtos com base ácida para alisar os fios que não ofereçam riscos à saúde, e que aliados a biotecnologia permitam associar outras matérias-primas e ativos que possibilitem um liso perfeito, preservando a integridade e a hidratação do fio.
Veja também ” A COR DOS COSMÉTICOS”.
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